O blog que chupa a merda que há na internet...

10.3.06

Chupa-"Hum,bem-pensado!" #10

Lisboa à margem.

Lisboa é uma cidade cheia de obstáculos.
Cada vez me convenço mais disso. Aqui a qualidade de vida paga-se mais, porque começa bem mais acima.
Tenho a sensação que quem construiu Lisboa começou por colocar os obstáculos, só depois construiu as casas e as estradas à volta.
O declive imenso do terreno, a desconsideração pela condição humana e pela facilitação da vida em geral. Os hospitais são decrépitos, as mesas dos cafés parecem mais as das cantinhas onde toda a gente tem de partilhar o espaço e misturar o sabor de uma meia de leite com o belo aroma de uma isca acabada de fritar, as ruas... (ver post seguinte), as esplanadas são roubadas à praia ou aos molhes, e até escarafunchadas debaixo do muro da marginal...
A propósito da marginal de Cascais, tomemos este exemplo. Ainda lá estive ontem.
Um pedaço de paisagem lindíssimo, fabuloso para ser disfrutado.

:)
O que é que fazem estas almas mouriscas?
:/

Espetam-lhe, mesmo junto à linha de água, com uma linha de comboio e uma estrada de tráfego intenso, perigosíssima, que ninguém pode atravessar a pé, e onde, ÓBVIAMENTE, muitos condutores se estampam.

As casas, prédios, moradias (as PESSOAS) ficam do OUTRO lado da estrada, isoladas como ilhas, com a vista de mar, sim, mas reféns da estrada perigosa mesmo ali em frente. Tão perto e tão longe. Como se a vista de mar fosse uma miragem, uma coisa para ver, mas não para disfrutar. A intenção aqui parece ter sido a de castigar algo que seria naturalmente agradável, fruível, e obrigar a um sacrifício penoso, e ainda por cima, um sacrifício pelo qual se pagam fortunas.
O que deveria ser simples, como chegar a casa, e ir de casa à praia, é uma jincana! Mais complicação, mais sacrifício, mais soluções enjeitadas em torno de uma autoestrada com vista de mar!!! É estúpido!!
Lá de onde eu venho, a província, seja Porto, Gaia, Matosinhos, Vila do Conde, Póvoa de Varzim (para citar os exemplos que conheço melhor) as marginais são para passear. Ali, onde o ar é fresco e cheira a maresia, e o sol se põe e a paisagem lava a alma, passeia-se.

PASSEIA-SE, não se COMUTA.
A pé, de bicicleta, de carro, até, mas a 30km/h.
Há lombas e passadeiras de peões e prioridade às pessoas e às bicicletas. E há estacionamento, e árvores e cafés, e esplanadas e parques de skate e jardins e fontes e estátuas e bancos de jardim. Estão a ver Belém? Pois, é assim, mas sem aquele stress da 24 de Julho, ou lá como se chama aquele pedaço de estrada. Por quilómetros e quilómetros e quilómetros... É disfrutável, entendem? DU-UH!!
As principais vias de acesso (linhas de comboio, autoestradas e IC's, aquelas que acusam o Cavaco de ter construído e que não vão para lado nenhum - vão, existem e são muito úteis, mas não se vêem de Lisboa) passam AO LARGO, onde não ameaçam a qualidade de vida das localidades (pronto, houve lavradores que se queixaram um bocadito).
Numa marginal (feita por gente e para gente), a estrada (não é estraaaaada) não tem mais de quatro metros de largura, pode ser atravessada em qualquer ponto e tem passeios largos. As moradias caríssimas, que pagaram pela localização, usufruem da localização, e ficam mesmo ali do outro lado da rua, em frente à praia ou ao rio, a fazer inveja a quem passa. É seguro para as crianças atravessarem a rua e irem brincar para a praia ou o jardim da marginal, sem terem de passar por túneis escuros e mijados ou passagens superiores intransponíveis para pessoas de mobilidade reduzida.
Gosto de estar em Lisboa, mas que é uma cidade construída à portuguesa no pior sentido, é mesmo!
Antes da Expo98, aquele magnífico pedaço de margem de rio era ocupado por fábricas, gasolineiras e armazéns!!! E agora, que descobriram a pólvora, um metro de chão está ao preço do ouro.
Vão-se lá chamar capital, mas definitivamente, é Lisboa que vive à margem da província.

(Desculpa, Jorge, eu tinha de postar isto)

posted by S. at 2:00 PM