Chupa-Ámen #10
Um novo filme português
Coisa Bera trata-se do novo filme do eminente realizador Silvestre Mirtilo.
Apesar de ainda não ter visto a luz do dia (ou a escuridão das grandes salas), esta obra já se afirma como épica no panorama cinematográfico luso. De acordo com a revista Artes & Culturas Urbanas, cerca de 50% dos leitores assinantes da sua edição online votaram “5 asteriscos” nesta obra, embora ainda não se saiba se o facto de se encontrarem asteriscos onde deviam estar estrelas se deve a uma complicação no código de linguagem do website.
Em todo o caso, sejam asteriscos ou estrelas, o que esta importante votação significa é que – dos 89 assinantes que compõem o público da referida revista – 44,5 terão dado nota máxima a um filme que ainda não viram. Segundo Marco Apolónio, editor da revista “[...]Só este facto já deve ser o suficiente para dar uma ideia sobre a importância que Coisa Bera terá no cinema nacional“.
O argumento de Coisa Bera demonstra claramente a genialidade de Silvestre Mirtilo. Ao decidir pegar em fábulas antigas, dando-lhes uma nova vida, Mirtilo – efectivamente – traz a cultura e identidade da população para a população.
Coisa Bera centra-se na história dos sete pastorinhos que se dedicaram a actividades de bruxaria e magia negra em Fatela, nos arredores do Fundão, por volta de 1920. Segundo consta na fábula, quatro dos sete pastorinhos terão observado uma imagem de Nossa Senhora de Fátima a surgir da penumbra de um enorme clarão. Nossa Senhora ter-se-á dirigido aos quatro pastorinhos que a observavam, tendo-lhes perguntado se se encontrava no caminho certo para chegar à auto-estrada A1 para Lisboa. Não se dirigiu verbalmente aos restantes três pastorinhos, uma vez que tinham sido estes os designados para tratar dos rebanhos naquela manhã e não se encontravam no local (afinal, alguém tinha de tomar conta dos animais).
Embora a Igreja Católica portuguesa tenha contestado a aparição, fazendo recurso a argumentos frívolos como “o facto da auto-estrada A1 ainda não existir nessa altura”, a verdade é que Roma não se comportou de forma diferente. Chegou mesmo a insinuar que alguns dos ingredientes utilizados pelos pastorinhos nos seus rituais de magia negra pudessem ter efeitos alucinogénicos. Algo que, como Dan Brown veio a descobrir mais de meio século depois, se tratou da mais pura das verdades. O fenómeno foi descoberto quando uma vaca começou descontroladamente a cacarejar como uma galinha, em 1976, quando pastava em Fatela e após ter trespassado as vedações que delimitavam a zona arqueológica da dita aparição.
Em qualquer dos casos, tenha ocorrido uma aparição ou uma alucinação, a verdade é que os pastorinhos deram com qualquer coisa. Não estamos a falar de Nossa Senhora, mas sim da droga que criaram de uma forma puramente casual. Foi essa droga, sintetizada por Hoffman nos anos 70 após ter assistido à primeira boom rave portuguesa (que, curiosamente, teve Fundão como palco), que deu origem aos ácidos sinápticos e, mais tarde, ao ecstasy.
E são estas relações ora históricas, ora documentais, que Mirtilo explora tão bem em Coisa Bera. A obra está tão bem elaborada que, em determinadas partes, não conseguimos perceber se estamos a assistir a um remake do Evil Dead com comentários de Bruce Campbell em português, ou a um documentário do canal Odisseia sobre a realidade das drogas na Península Ibérica.
Um filme que ninguém deverá perder.
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